O maior conteúdo digital de cultura regional do país
Registro das artes e culturas da Paraíba
O maior conteúdo digital de cultura regional do país
Registro das artes e culturas da Paraíba
Data de publicação do verbete: 06/10/2016

Revolta de Princesa

Um movimento liderado por José Pereira Lima, deflagrado no município de Princesa, atual Princesa Isabel, na Paraíba, em fevereiro de 1930.
Data de publicação: outubro 6, 2016

Local: Princesa Isabel – PB

Início: 24 de fevereiro de 1930

Fim: 19 de agosto de 1930

Personagens: João Pessoa, José Pereira, João Dantas, João Suassuna, irmãos Pessoa de Queirós, Washington Luís.

Motivos: Reformas no sistema tributário implantado pelo presidente da Paraíba – João Pessoa.

Desfecho: Assassinato de João Pessoa cometido pelo advogado João Dantas por motivos pessoais.

Mortes: 600 mortos.

A Revolta de Princesa – Revolta na Caatinga foi um movimento liderado por José Pereira Lima, deflagrado no município de Princesa, atual Princesa Isabel, na Paraíba, em fevereiro de 1930, em oposição ao governo estadual de João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque.  Com o assassinato de João Pessoa no mês de julho, a revolta perdeu substância, e seus líderes entraram em acordo com o governo federal para a pacificação da Paraíba.

O movimento teve suas origens na posse de João Pessoa na presidência da Paraíba, em 22 de outubro de 1928. Ao assumir o poder, o novo presidente tinha o objetivo de iniciar uma reformar na estrutura político-administrativa e reerguer as finanças do Estado, deslocando para o litoral a hegemonia do comércio estadual. O plano de João Pessoa causou discórdias políticas e econômicas com os poderosos coronéis do interior do Estado.

Devido à ausência de qualquer barreira tributária, chefes políticos do Sertão, faziam comércio diretamente com os estados vizinhos, em especial, Pernambuco. A prática provocava enormes perdas de divisas tributárias ao Estado paraibano.

Com o sistema de arrecadação tributária, aplicado pelo presidente, haveria distinção entre as mercadorias importadas pelo litoral, através do Porto de Cabedelo, e aquelas que entravam na Paraíba pelas fronteiras terrestres. Essas medidas, consolidadas com a Lei número 673, de 17 de novembro de 1928, tornou a prática do comércio dos sertanejos com os estados vizinhos impossível. Por isso, o presidente do Estado começou a ser chamado pejorativamente de “João Cancela/Porteira”.

Em Pernambuco, estado atingido diretamente pelas medidas, foi iniciada uma campanha no Jornal do Commércio pelos irmãos Pessoa de Queirós, primos de João Pessoa, contra a chamada “guerra tributária”. Na Paraíba, a defesa da administração do presidente ficou por conta do jornal A União, veículo oficial.

O desprestígio dos chefes políticos do interior por parte governo e as discussões travadas na imprensa alimentaram o descontentamento dos coronéis. Os atritos também atingiram velhos correligionários do Partido Republicano da Paraíba (PRP), ligados por laços de fidelidade partidária ao seu tio Epitácio Pessoa, ex-presidente da República (1919-1922) e líder supremo da política paraibana.

O principal deles era o chefe político de Princesa Isabel, o coronel José Pereira de Lima. Detentor de maior prestígio na região, tanto na esfera estadual, quanto na federal, se tornaria o líder do movimento. Era fazendeiro, comerciante, deputado e membro da Comissão Executiva do PRP. A distância de 428km da capital e a proximidade da fronteira com Pernambuco, faziam com que a economia de Princesa fosse totalmente voltada para o estado vizinho.

Concomitante a essas reformas, as eleições presidenciais de 1930 aproximavam-se. Em 29 de julho de 1929, após uma reunião com o diretório do PRP, presidido por João Pessoa, o governador declarou que não daria seu apoio à chapa Júlio Prestes-Vital Soares. Chegava ao fim a “política do café com leite” na qual a presidência do país era revezada entre São Paulo e Minas Gerais. A atitude ficou conhecida como o “Nego” que seria incorporado à bandeira do estado pouco depois.

Devido a sua atuação e posição política, João Pessoa foi escolhido para participar da chapa da Aliança Liberal ao lado de Getúlio Vargas. Sua candidatura foi lançada em 30 de julho de 1929. O episódio unificou por algum tempo o PRP. Em 18 de fevereiro de 1930, João Pessoa empreendeu excursão por vários municípios a fim de obter o apoio eleitoral dos “coronéis” que vinha combatendo desde o início de seu mandato. Visitou, inclusive, os municípios de Princesa e de Teixeira, sendo o último dominado pela família Dantas. Em Princesa foi recebido com grande manifestação popular e recepcionado com um banquete na casa de José Pereira, onde se hospedou.

Paralelamente a essa conjuntura e as vésperas das eleições, a cúpula do PRP se reúne em convenção para compor a chapa para concorrer aos cargos de Senador e Deputado Federal. João Pessoa defendia o princípio da não reeleição e propunha o revezamento dos candidatos. Foram desprezados por ele nomes como os de João Suassuna, Flavio Ribeiro Coutinho e os de outros coronéis do interior paraibano. No entanto, João Pessoa não abriria mão da candidatura de seu primo, Carlos Pessoa.

O objetivo do presidente da Paraíba era barrar a candidatura de João Suassuna. Ex-presidente do Estado, deputado federal em duas legislaturas, Suassuna era aliado de famílias poderosas do interior como a dos Pereira Lima e a dos Dantas.

A atitude de João Pessoa representou a ruptura formal dos coronéis do Sertão Paraibano com a administração estadual. Com o apoio de políticos como João Suassuna, Oscar Soares, Pedro Firmino, o padre Manuel Otaviano, Inácio Evaristo, Cícero Parente, Nilo Feitosa, Duarte Dantas, o coronel decidiu resistir a essas investidas contra seus poderes.

Em 24 de fevereiro, um telegrama remetido por José Pereira marca simbolicamente esse rompimento. O coronel informava na carta que ele e seus aliados acabavam de aderir ao Partido Republicano Conservador (PRC), defendendo, portanto, a candidatura Júlio Prestes-Vital Soares. Veja a reprodução do telegrama a seguir:

“Dr. João Pessoa – Acabo de reunir amigos e correligionários aos quais informei do lançamento da chapa federal. Todos acordaram mesmo que V. Excia, escolhendo candidatos à revelia Comissão Executiva, caracteriza palpável desrespeito aos respectivos membros. A indisciplina partidária que ressumbra do ato de V. Excia, inspirador de desconfianças no seio do epitacismo, ameaça de esquecimento os mais relevantes serviços dos devotados à causa do partido. Semelhante conduta aberra dos princípios do partido, cuja orientação muito diferia da atual, adotada singularmente por V. Excia. Esse divórcio afasta os compromissos velhos baluartes da vitória de 1915 para com os princípios deste partido que V. Excia. Acaba de falsear. Por isso tudo delibero adotar a chapa nacional, concedendo liberdade a meus amigos para usarem direito voto consoante lhes ditar opinião, comprometendo-me ainda defendê-los se qualquer ato de violência do governo atentar contra direito assegurado Constituição. Saudações (a) José Pereira”.

O dia 24 de fevereiro de 1930, data da decisão no PRP, é considerado o início do movimento rebelde, conhecido como Revolta ou Guerra de Princesa.

A resposta de João Pessoa a decisão dos coronéis veio dias depois. Ele ordenou o esvaziamento da máquina burocrático-administrativa do município e mandou a polícia invadir o município de Teixeira, reduto dos Dantas prendendo pessoas da família e impedindo que ocorresse votação naquela cidade. O mesmo deveria ocorrer em Princesa, mas lá haveria reação.

Logo após as eleições de 1º de março, iniciou-se no Sertão Paraibano a luta armada. Sob o comando do coronel José Pereira, um contingente de cerca de dois mil homens armados, partiram da Serra de Teixeira, no Sertão da Paraíba, em combate a batalhões da Policia Militar do Estado. A polícia estadual contava com apenas 850 homens. O interesse do governo federal na derrota política de João Pessoa impedia o envio de reforços vindos de Minas e do Rio Grande do Sul.

Os rebeldes contavam com o auxílio em dinheiro e em munições dos Pessoa de Queirós, de Pernambuco e com uma grande quantidade de armas do próprio governo estadual, de gestões anteriores, entregues para enfrentar o bando de Lampião e a Coluna Prestes. A maioria dos combatentes era de egressos do cangaço ou desertores da própria polícia paraibana.

Para precipitar a queda de João Pessoa os sublevados planejavam que o governo federal fizesse uma intervenção na Paraíba. Em 3 de maio de 1930, o presidente da República Washington Luís sugeriu ao Congresso que se apresentasse um pedido formal de intervenção na Paraíba. Como o pedido feria a Constituição, não foi aceito. Isso só seria permitido se o próprio João Pessoa a solicitasse, o que ocorreria.

Por essa época, já não havia grandes perspectivas para ambas as partes na luta armada. Por um lado, a polícia estadual não tinha condições de tomar Princesa. Por outro, os recursos dos revoltosos para alimentação e para manter as armas já estavam se esgotando.

No início de junho, Washington Luís enviou à Paraíba cinco batalhões de caçadores do Exército e um vaso de guerra. Enquanto isso, os Pessoa de Queirós e outros líderes da revolta se articulavam para confundir ainda mais o momento político local. Em 9 de junho de 1930 é decretado o território livre de Princesa, através de uma lei assinada por uma “junta governativa” integrada por José Pereira, José Frazão Medeiros Lima e Manuel Rodrigues Sinhô.

Com a declaração de independência provisória da cidade do Estado da Paraíba, passou a chamar-se República de Princesa, com direito a hino, bandeira, jornal (O Jornal de Princesa), moeda e leis próprias. Veja a seguir a reprodução do documento:

DECRETO Nº 1, DE 9 DE JUNHO DE 1930

Decreta e proclama provisoriamente a independência do Município de Princesa, separado do Estado da Paraíba e estabelece a forma pela qual deve ele se reger.

A administração provisória do Território de Princesa, instituída por aclamação popular, decreta e proclama a resolução seguinte:

Art.1º – Fica decretada e proclamada provisoriamente a independência do Município de Princesa, deixando o mesmo de fazer parte do Estado da Paraíba, do qual está separado, desde 28 de fevereiro do corrente ano.

Art.2º – Passa o Município de Princesa a constituir, com os seus limites atuais, um território livre, que terá a denominação de Território de Princesa.

Art.3º – O Território de Princesa, assim constituído, permanece subordinado politicamente aos poderes públicos federais, conforme se acham estabelecidos na Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil.

Art.4º – Enquanto, pelos meios populares, não se fizer a sua organização legal, será o território regido pela administração provisória do mesmo território.

Cidade de Princesa, 9 de junho de 1930. – José Pereira Lima* – José Frazão Medeiros Lima** – Manuel Rodrigues Sinhô***

(*) deputado estadual e “coronel”

(**) prefeito de Princesa

(***) presidente da Câmara Municipal de Princesa.

Com grandes dificuldades de debelar a Revolta de Princesa, o governo paraibano autorizou a polícia da Paraíba a invadir casas e escritórios de pessoas suspeitas de receber ou estocar armas e munições destinadas a Princesa. Na realidade, tratava-se de um pretexto para invadir e violar casas e escritórios de seus adversários políticos. Uma dessas invasões, noticiada pelo Jornal A União, de 22 de julho de 1930, foi no escritório do jornalista e advogado sertanejo João Dantas. Documentos íntimos foram apreendidos e divulgados pelo Jornal A União. Além de detalhes de suas articulações políticas, foram publicadas informações de seu relacionamento com a jovem poeta Anayde Beiriz.

Como resposta, Dantas desferiu violentas críticas a João Pessoa e família através de artigos publicados no Jornal do Comércio do Recife. Na Paraíba, o Jornal A União inicia uma série de reportagens contra a família Dantas, aquecendo o embate.

No dia 26 de julho de 1930, João Pessoa é assassinado em Recife por João Dantas. O presidente paraibano encontrava-se no Recife, em visita a lideres liberais pernambucanos. Dantas, enfurecido pelas últimas notícias publicadas no Jornal A União, foi ao seu encontro. No final da tarde daquele dia, na confeitaria Glória, no Recife, o presidente é baleado e morto. Embora João Pessoa não o conhecesse pessoalmente, foi morto pelo homem que o ameaçara há poucos meses.

O assassinato de João Pessoa se tornaria o estopim para a Revolução de 1930 que poria fim aos anos de República Velha (1889-1930). Os núcleos revolucionários davam uma significação social e política à tragédia. Acusavam o Palácio do Catete de envolvimento no assassinato, tornando o “sacrifício” do paraibano em bandeira de luta.

Com a morte de João Pessoa a força do movimento armado de Princesa se perdeu. O Presidente da República, Washington Luiz, decidiu terminar com a Revolta de Princesa e José Pereira não ofereceu resistência. Conforme acordo prévio, seiscentos soldados do 19º e 21º Batalhão de Caçadores do Exército, comandados pelo Capitão João Facó, ocuparam a cidade em 11 de agosto de 1930, pondo fim oficialmente ao Território Livre de Princesa. Já no dia 19 de agosto, o general Lavenère Wanderley, comandante da 7ª Região Milita, sediada em Recife, comunicava a Álvaro de Carvalho, que assumira o governo da Paraíba, a pacificação do Estado.

No dia 4 de setembro de 1930, em decorrência de grande pressão popular, a Assembleia Legislativa votou lei, sancionada por Álvaro de Carvalho, estabelecendo a mudança de nome da capital paraibana para João Pessoa. No dia 9 criou-se nova bandeira para o estado, tendo a palavra “Nego” como dístico.

No dia 6 de outubro, os corpos de João Dantas e de seu cunhado Augusto Caldas, na época dados como suicidas, foram encontrados em uma enfermaria da Casa de Detenção de Recife. A causa da morte desses personagens é motivo de discussão até hoje.

No dia 29 de outubro de 1930, a Polícia Estadual ocupou a cidade de Princesa com trezentos e sessenta soldados comandados pelo Capitão Emerson Benjamim, passando a perseguir os que lutaram para defender a cidade ameaçada, humilhando e torturando os que foram presos, sem direito a defesa. A luta teve um balanço final de, aproximadamente, seiscentos mortos. Depois de anistiado, em 1934, José Pereira foi residir na fazenda “Abóboras” em Serra Talhada (PE).

Fontes:

https://tokdehistoria.com.br/2015/03/18/a-revolta-de-princesa-guerra-na-caatinga/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Territ%C3%B3rio_de_Princesa

http://cariricangaco.blogspot.com.br/2014/03/a-guerra-de-princesa-pormardson-medeiros.html

http://www.franklinmartins.com.br/estacao_historia_artigo.php?titulo=coronel-x-governador-a-revolta-da-princesa

http://culturapopular2.blogspot.com.br/2011/02/revolta-de-princesa.html

http://entretenimento.r7.com/blogs/bemvindo-sequeira/2012/06/07/a-historia-que-o-brasil-nao-conhece-a-guerra-de-princesa/

http://clubedahistoria.com.br/post.php?codigo=212

http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/PRINCESA,%20Revolta%20de.pdf

http://www.anpuhpb.org/anais_xiii_eeph/textos/ST%2002%20-%20Arthur%20Silveira%20Guimar%C3%A3es%20TC.PDF

http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/PESSOA,%20Jo%C3%A3o.pdf/

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *