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Teatro e pandemia: a reinvenção da classe artística em tempos de crise

A classe artística ainda ouve com frequência a frase “todo artista é vagabundo” e, infelizmente, esse tipo de comentário mostra que na sociedade, ainda existe a ideia de arte como algo supérfluo e dispensável. Um preconceito estrutural em relação às artes, provavelmente atrelado à crença do valor mercadológico das profissões, no sentido de que há algumas mais importantes e “úteis” que outras. Diante da falta de políticas assistenciais eficazes direcionadas a classe artística, principalmente em períodos de crise, como o atual, este preconceito se torna evidente.

O mundo não é mais o mesmo desde o início da pandemia de covid-19, as consequências são econômicas, sociais e também psicológicas. Os dilemas a serem resolvidos são muitos.  A pausa dada no cotidiano da humanidade levou cada indivíduo a pensar sobre formas de resistir no mundo lidando com o trabalho, relações, a maneira como utilizar recursos e o que se espera de fato da classe política. 

Novas formas de resistência têm sido pensadas pelos artistas, já que temporadas de espetáculos, apresentações e shows foram cancelados. Foram surgindo iniciativas com o intuito de viabilizar as obras de artistas de teatro e músicos, como uma forma de atenuar os impactos da covid-19 na economia criativa. 

Sobre as novas formas de reinvenção da classe artística em tempos de pandemia, o ator, diretor e produtor cultural Edilson Alves, de João Pessoa-PB, respondeu em entrevista ao Paraíba Criativa, “a necessidade obriga o ser humano a se adaptar ao frio, ao calor, à fome, à miséria, à luxúria e assim por diante. Nas artes não poderia ser diferente, nós artistas tivemos que nos adaptar ao que foi possível fazer. No meu caso, o teatro especificamente, tivemos que colocar espetáculos já gravados anteriormente nas redes sociais, para que as pessoas pudessem ver, conhecer, descobrir e fazer teatro para câmera de celular. Essa adaptação ajudou a gente a migrar para uma área até pouco tempo desconhecida.”

Confira a entrevista completa!

O problema isolamento fez com que as equipes fossem reduzidas. Com isso, várias atividades ficam concentradas em única pessoa? Como foi esse processo na sua equipe?

Isso é uma pura verdade. Consigo dividir em três tempos: logo no pico da pandemia houve o silêncio, o desgosto e medo de não poder se reinventar. Depois, no segundo momento, descobrimos que era possível, estudar, ler, ensaiar e conversar pela internet, desta forma tivemos uma injeção de ânimo, mesmo com todos em casa e a distância. Já no terceiro momento, descobrimos que a máscara ajuda a nos protegermos e poder fazer nossa arte para o vídeo. É claro que, 90% das atividades  ficaram  para os coordenadores, seja no processo de  criação  artística e/ou  administrativa, depois, as  ideias e os resultados  são passados  para o restante do  grupo.

As apresentações em lives vieram para ficar? 

Acredito que sim, porém, não quero que isso seja uma rotina na minha vida, se tiver que fazer, farei com a mesma garra do presencial. Mas, a energia do presencial supera qualquer expectativa das lives. Já gravávamos os espetáculos antes da pandemia, filmávamos os espetáculos para registro artístico, exibição posterior nas redes sociais de modo geral. Agora continuaremos a filmar, porém com outro olhar e objetivo. 

O universo da internet e das plataformas digitais não é algo que todos absorvem com facilidade. Foi um processo difícil, muitos colegas tiveram dificuldades?

No meu caso não, no nosso grupo adaptamos espetáculos com dois atores que fazíamos no palco ao vivo antes da pandemia, gravamos, fizemos ao vivo e foi para redes sociais e internet, deu super certo. Não ficamos com sentimento de insucesso, pelo contrário. Você se lembra do teatro medieval? Veja quantas mudanças, quantos recursos com relação ao teatro contemporâneo de hoje.

Então, acredito que sim, teremos teatro on-line com mais recursos, porém longe de ter a atração, sensação e emoção que o presencial tem. Talvez por ser um elemento novo que ainda estamos nos adaptando. A dificuldade se agrava mais na classe artística menos favorecida, a exemplo de gravação de vídeos, preenchimentos de formulários para concorrer a editais, festivais e mostra de artes de uma maneira em geral, inclusive às vezes, de interferir na qualidade da inscrição ou até mesmo de concorrer.  

O que você pensa sobre a posição e medidas do governo durante a pandemia em relação aos profissionais do teatro? 

Totalmente descabida de atenção. Afinal, são 15 meses sem atividade presencial nenhuma e nenhuma perspectiva de retorno. Aqui na Paraíba, ainda mais na capital, no ano de 2020 a Prefeitura de João Pessoa não fez absolutamente nada, a não ser a utilização dos recursos vindos do governo federal através da Lei Aldir Blanc.

No governo estadual foi pensado e criado uma Lei de Auxílio aos artistas paraibanos, chamada Lei Zabé da Loca, em homenagem a grande artista paraibana da área da música popular, mas esta lei foi barrada pelo referido governador. Mas mesmo assim o estado, através da Secretaria de Cultura ainda lançou dois editais para favorecer os artistas da Paraíba com recursos próprios, ao contrário da Prefeitura de João Pessoa. O governo do estado também distribuiu recursos da Lei Aldir Blanc através de editais e prêmios. Mesmo assim, estão longe de serem políticas culturais definidas como satisfatórias para o movimento cultural do estado.

Os fóruns, sindicatos e organizações de teatro tem se mobilizado? De que formas?

Sim, todos esses movimentos tem sido o grande puxador destas ações. São essas   organizações que têm provocado, articulado, exigidos dos governos ações e soluções para esta crise com relação a classe artística.

Israela Ramos

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